Educação e Inteligência Artificial - Abertura de call para o nº 3 Série III
Publicada em 2025-07-22A rápida integração da inteligência artificial generativa (IAGen) nos sistemas educativos tem vindo a transformar a forma como se concebe a educação, no presente e no futuro, ao despertar tanto entusiasmo quanto prudência.
Para alguns profissionais e investigadores, a inteligência artificial (IA) representa uma oportunidade ímpar para transformar as práticas pedagógicas, ao promover uma maior personalização dos percursos de aprendizagem, o alargamento do acesso ao conhecimento e a melhoria do acompanhamento a estudantes e docentes. Neste enquadramento, a IA redefine a relação com o saber, ao introduzir novas formas de interação, tutoria adaptativa, geração de conteúdos educativos e apoio à aprendizagem autónoma. As suas ferramentas possibilitam o apoio à planificação docente, nomeadamente na formulação de objetivos, na clarificação de conceitos e na criação de recursos pedagógicos. Revelam-se particularmente vantajosas em contextos marcados pela diversidade linguística e cultural, ao facilitarem a comunicação entre os diferentes atores educativos e ao contribuírem para a aprendizagem das línguas e consequente comunicação. Além disso, a IA consolida uma avaliação mais equitativa, ao permitir a identificação de padrões e dificuldades sem os enviesamentos associados a preconceitos ou estereótipos (Candeias & Correia, 2023).
Para outros, esta tecnologia levanta sérias preocupações: poderá reduzir as interações humanas, fomentar a dependência de algoritmos, desumanizar os processos educativos e acentuar desigualdades digitais. Alertam ainda que a IA na educação tem sido amplificada por discursos mediáticos, que tendem a obscurecer as limitações técnicas, os riscos éticos e a ausência de reflexão pedagógica. Quanto a este último aspeto, enfatizam a diminuição progressiva das competências de escrita por parte dos estudantes, que, ao recorrerem de forma acrítica a ferramentas de geração automática de texto, podem comprometer a sua capacidade de expressão, de construção argumentativa e de pensamento crítico. Simultaneamente, afirmam que se intensifica o risco de fraude académica, com a submissão de trabalhos integralmente produzidos por IA, muitas vezes difíceis de detetar pelos docentes e para os quais as instituições ainda não dispõem de respostas avaliativas e formativas adequadas. Segundo esta abordagem, estas práticas desafiam os princípios de integridade académica e colocam os professores perante novas exigências pedagógicas, avaliativas e éticas, para as quais nem sempre se encontram devidamente preparados ou apoiados. (Gallifa & Flores, 2025; García-López & Trujillo-Liñán, 2025; Lima et al., 2024; Siham & Sophia, 2024).
O impacto da IA em contextos educativos parece, assim, depender da forma como as instituições e os docentes integram estas tecnologias nas suas práticas. Como argumentam Moreira e Horta (2020), o uso das tecnologias digitais só contribui efetivamente para uma educação de qualidade quando associado a uma intencionalidade pedagógica clara, orientada para o sucesso educativo, a inovação metodológica e o desenvolvimento de competências. A superação de visões dualistas exige uma conceção híbrida da educação, capaz de combinar diferentes espaços, tempos, recursos e abordagens. Neste sentido, Moreira e Schlemmer (2020) sustentam que a verdadeira educação digital ocorre quando as tecnologias são incorporadas em ecossistemas de aprendizagem dinâmicos e motivadores, que potenciem o processo pedagógico e o desenvolvimento das competências essenciais para o século XXI.
Neste contexto de ambivalência e de transformação tecnológica, impõe-se uma análise crítica, informada e multidimensional das mudanças pedagógicas, éticas e institucionais em curso, nos diferentes níveis e contextos de ensino, de forma a garantir que a integração da IA na educação se faz de modo responsável e informado. Esta integração requer ajustamentos pedagógicos intencionais, bem como uma colaboração estreita entre professores, estudantes, investigadores e decisores políticos, no sentido de desenvolver orientações que assegurem um uso ético e contextualmente adequado da IA generativa no campo da educação.
Esta call dirige-se a investigadores, professores e profissionais da educação, em Portugal e em todo o mundo, num convite à submissão de artigos que, a partir de uma perspetiva de investigação, analisem os impactos, os desafios e as potencialidades da inteligência artificial no campo da educação, com especial atenção nos seguintes eixos temáticos:
- Desigualdades sociais e acesso à inteligência artificial na educação
- Autoria e integridade académica
- Transformações nas relações pedagógicas e nas interações em sala de aula
- Novas formas de controlo do trabalho dos professores
- Impacto da IA nas competências de leitura, escrita e pensamento crítico
- Formação docente e apropriação crítica da IA na prática pedagógica
- Políticas públicas e regulação da IA na educação
- Culturas digitais juvenis e construção da cidadania em tempos de IA
- Mudanças nos modos de investigar a educação com IA